
O SORRISO DE MONALISA
O filme, O Sorriso de Monalisa, se passa no ano de 1953 e conta a trajetória da professora de história da arte, interpretada por Julia Roberts, Katherine Watsom que sempre sonhou em lecionar na Faculdade Wellesley. Apesar de sua inteligência singular, Watsom trazia sobre os ombros ideais e comportamentos totalmente incompatíveis aos costumes tradicionais da nova universidade em que estava sendo inserida.
Wellesley se prendia a um tradicional método de ensino que procurava formar excelentes esposas, responsáveis mães e eficientes “donas do lar” que entendessem de física, arte, biologia, literatura. Com a chegada de Katherine Watsom, solteira, da Califórnia e cheia de ideais boêmios, a faculdade é arremessada num intenso conflito de tradições, costumes e convicções.
Já na primeira aula a professora novata entende porque as garotas de Wellesley são consideradas as mulheres mais inteligentes do país. Antes mesmo de iniciar a aula, todas já tinham lido o programa de História da arte, conheciam os principais quadros, seus pintores e o ano em que foram pintados. Percebendo o quanto as alunas estavam presas a um programa, a professora as surpreende com uma aula não registrada nos livros, e agora, que não havia ninguém a lhes dizer o que pensar, foram confrontadas com questionamentos: “O que é arte? Quando uma obra é boa ou má? E quem decide isso?”
Aos poucos, com um método de ensino nada convencional ao lugar, Katherine foi infiltrando na faculdade muitos dos seus ideais, mudando comportamentos e plantando exemplos, que mais tarde se mostrariam em decisões e escolhas na vida de muitas de suas alunas.
Apesar do bom enredo e das grandes atuações, faz-se necessário uma análise do momento histórico do filme. No ano de 1953 o mundo vive um período de restauração. Com o fim da segunda guerra mundial ainda muito recente, procurava-se o resgate dos ideais de família, nação, povo e de lar. Por outro lado o mundo ainda vive um período de guerra fria e passa por um processo de polarização em que os Estados Unidos, capitalista, e a União Soviética, socialista, procuram aumentar suas áreas de influência.
Diante disso o que prevalece na sociedade da época é justamente esse espírito de resgate, em que a família bem estruturada, feliz e consumista é a principal propaganda do ideal capitalista. Sendo assim, um soldado condecorado pelo exercito e que bravamente lutou em favor de seu país é com certeza o esposo ideal. Para as mães das jovens, vê-las bem casadas era a garantia de um futuro estável diante das eminentes ameaças de uma nova guerra.
Levando em consideração esse período histórico, percebe-se que muitos conceitos e idéias passados através do filme não se aplicam ao período histórico atual, principalmente após o advento do movimento feminista, momento em que as mulheres decidem abrir mão de serem apenas esposas e mães e partem para a disputa no mercado de trabalho. Porém há alguns atos pedagógicos no filme que merecem destaque e são intensamente discutidos nos dias atuais.
Na cena em que a professora traz para a sala de aula o desafio da pergunta “o que é arte?”, relembra os períodos da Grécia antiga em que o ensino era fundamentado em questionamentos que incomodavam o aluno a buscar uma solução. Atualmente, principalmente no ensino de ciências, é como se todas as questões já estivessem resolvidas. O aluno não é mais incitado à busca de uma solução, isso porque alguém já a encontrou, como se existisse apenas uma única “forma certa de pensar”. Isso é posto no filme claramente quando uma aluna questiona sua baixa nota, visto que seu trabalho está de acordo aos pensamentos de um determinado autor.
Essa incitação à discussão, ao desafio, ao antigo diálogo questionador grego e, principalmente “des-enformador” da “forma certa de pensar”, é um dos caminhos necessários a ser construido para o aperfeiçoamento do processo ensino-aprendizagem, visto que o aluno não tem mais o autor de um livro lhes dizendo o que é o certo. Porém esse diálogo deve ser incitado desde as séries iniciais, e para tornar isso possível, nada melhor do que as verdadeiras aulas de filosofia, que atualmente também necessitam de urgente reformulação para que se tornem prazerosas.
No livro Assim Falou Zaratustra, do filósofo Friedrich Nietzsche, depois de dez anos de reclusão nas montanhas Zaratustra retorna à cidade e um eremita lhe diz: “Esse caminhante não me é estranho. Muitos anos atrás ele passou por esse caminho. Naquele tempo tu levavas tuas cinzas para as montanhas. E agora tu levas teu fogo para os vales? Não tens medo de ser punido como incendiário?”. Nas escolas atuais os alunos são bombardeados com milhões de informações, segundo Nietzsche falta nesse processo de bombardeio o fogo vindo das montanhas que causa o espanto e para os gregos, é desse espanto que provém o pensamento, pensando, processa-se as informações e produz-se conhecimento. A arte moderna de Picasso e de Jackson Pollock foi o fogo das montanhas no filme.
Além do diálogo e da provocação desse espanto, é relevante também que haja entre professor e aluno uma relação de amizade. Em Conversas Sobre Educação, livro de Rubem Alves, ele defende que às vezes se aprende uma coisa de que não se gosta por se gostar da pessoa que a ensina. O fato de admirar o mestre ativa a vontade de aprender as coisas que ele sabe, porque saber o que ele sabe é uma forma de estar com ele. Isso é perceptível em O Sorriso de Monalisa no ultimo editorial escrito por Elizabeth Warren, quando ela diz “nunca me esquecerei dela” referindo-se à professora Watson.
Apesar das discrepâncias entre o período histórico do filme e o período histórico atual, tomando como ponto de partida que as prioridades da sociedade da época são muito diferentes das prioridades da sociedade contemporânea, o que o torna, de certa forma, inviável como base de análise dos métodos de ensino, ainda assim, O Sorriso de Monalisa traz no seu enredo questionamentos que merecem um olhar criterioso.
A pergunta feita por Katherine Watsom em relação ao que o futuro espera das alunas é transferida hoje para a pergunta da filósofa Viviane Mosé “Que tipo de pessoa a escola busca formar?” E será que “formar” é a palavra certa, visto que toda “forma” é fechada e a proposta da educação é a de ABRIR? Como afirma Rubem Alves: “Não existe nada mais fatal para o pensamento que o ensino das respostas certas. As escolas existem não para ensinar as respostas, mas para ensinar as perguntas”.
Essa é a melhor análise de um filme que já vi na minha vida. Muito bem escrito com referências bibliográficas, faz entender muito bem sobre o que trata o filme. Só podia mesmo ser uma serva de Deus e ter a mente de Cristo. Parabéns e continue assim!!!
ResponderExcluirAndréa Danielle
Igreja Batista do Evangelho Pleno Uberlândia-MG